Desde meados dos anos 90, novas formas de estruturar o processo de planejamento e controle da produção (PCP) vêm sendo adotadas na indústria da construção, com base em conceitos e princípios provenientes do chamado paradigma da Produção Enxuta. Dentre as várias abordagens, merece destaque o Sistema Last Planner de controle da produção, cuja implementação em diferentes países, inclusive no Brasil, vem sendo amplamente reportada e discutida nos congressos anuais do IGLC (International Group for Lean Construction).
O Last Planner foi originalmente desenvolvido por dois americanos, Glenn Ballard e Gregory Howell, ambos vinculados ao Lean Construction Institute dos EUA, mas tem sofrido muitas contribuições para a sua evolução tanto por acadêmicos como por profissionais da indústria.
Tal como se observa em outros países, várias das empresas brasileiras que se destacam na gestão da produção são aquelas que tiveram capacidade de entender e adaptar as ideias da Produção Enxuta para o contexto da construção civil.
De fato, uma das principais dificuldades enfrentadas para a implementação do Last Planner é a falta de compreensão por parte dos principais envolvidos no planejamento e controle da produção dos conceitos e princípios fundamentais de gestão da produção.
Curto, médio e longo prazos
No Last Planner, o PCP normalmente é dividido em três níveis: planejamento de longo prazo, planejamento de médio prazo (também conhecido como look-ahead planning) e planejamento de curto prazo. No primeiro nível, define-se o sequenciamento, a duração e o ritmo das grandes etapas da obra.
O planejamento look-ahead tem várias funções, entre as quais se destaca o controle dos fluxos de trabalho entre as unidades de produção pela identificação e remoção sistemática das restrições. Por meio desse mecanismo, busca-se reduzir a variabilidade nos fluxos de trabalho a montante, evitando que a mesma se propague para as unidades de produção a jusante, ao longo desses fluxos.
Por meio da redução da variabilidade nas unidades de produção e nos fluxos de trabalho, busca-se evitar que o mesmo seja interrompido ou realizado em condições inadequadas. Com isso, pode-se esperar um aumento de produtividade das unidades de produção e, assim, uma melhoria no desempenho do empreendimento, pela redução de custos e de prazos.
O terceiro e último nível tem como papel principal atribuir pacotes de trabalho às equipes e gerenciar os compromissos com as mesmas, em relação ao que vai ser feito, após a avaliação do que pode e do que deve ser feito, baseados nos recursos disponíveis e no cumprimento de pré-requisitos. O indicador PPC é uma medida da eficácia nesse nível de planejamento. O nome do sistema, Last Planner (último planejador) é uma alusão a quem, em última instância, define as tarefas a serem executadas no nível de curto prazo.
A proteção da produção (shielding production) se dá no momento da elaboração dos planos semanais de produção, ao se garantir que apenas sejam incluídas tarefas que tenham todas as suas restrições removidas, incluindo a disponibilidade de recursos (materiais, mão de obra, equipamentos, projeto, espaço, entre outros) e a conclusão das atividades antecedentes.
Esse mecanismo permite obter a chamada estabilidade básica, definida como a capacidade de produzir resultados coerentes ao longo do tempo, decorrente da disponibilidade constante em relação a recursos. Como resultado, obtém-se um aumento na previsibilidade (ou confiabilidade) do sistema de produção, apontada como um requisito essencial para a implementação de mudanças mais radicais na gestão da produção, tais como o fluxo contínuo e a produção puxada.
Produção puxada
Por meio do sistema Last Planner, é introduzido um conceito adaptado de produção puxada, segundo o qual um sistema puxado é aquele que libera materiais ou informações no sistema de produção com base no estado do mesmo, observado por meio da quantidade de trabalho em progresso e qualidade de tarefas disponíveis, entre outros fatores.
Essa forma de planejar contrasta com a visão de produção empurrada, adotada em sistemas tradicionais de planejamento baseados em técnicas de rede (CPM), nos quais os planos de longo prazo, bastante detalhados, constituem-se nos únicos planos formalizados.
De fato, o Last Planner introduz a produção puxada tanto no nível de médio quanto de curto prazo. No médio prazo, faz-se a identificação de restrições, o que desencadeia uma série de ações de remoção das mesmas, incluindo a aquisição ou a produção de recursos para a produção. No curto prazo, analisam-se as tarefas programadas e os recursos disponíveis, liberando para a produção apenas aquelas que realmente têm condições de serem realizadas.
O sistema de gestão resultante passa então a ser uma combinação de produção empurrada e puxada, uma vez que continua havendo a necessidade de um plano de longo prazo que estabelece as metas do empreendimento, já que a demanda na construção tem um caráter dependente, ao contrário de outras indústrias.
Nessa abordagem, há uma formalização e sistematização do planejamento em nível de médio e curto prazo, obtendo-se um aumento da transparência. Tanto as planilhas utilizadas quanto os indicadores são relativamente simples. Assim, facilita-se a comunicação entre os envolvidos e a aderência entre os vários níveis de planejamento, à medida que é possível realizar um controle mais eficaz em todos os níveis.
Essa formalização resulta também em um curto ciclo de controle formalizado da produção, resultando em alguns benefícios tais como a identificação rápida de problemas, a diminuição da necessidade de estimativas de longo prazo e a introdução de medidas corretivas de forma mais rápida. Espera-se que, ao longo do tempo, a partir da análise da frequência das causas da não conclusão dos pacotes de trabalho, sejam realizadas ações corretivas, visando a evitar a reincidência dos referidos problemas.
No Last Planner, existem vários mecanismos de gestão participativa, tanto na geração dos planos como na avaliação dos resultados, por meio de reuniões de planejamento realizadas sistematicamente nos níveis de médio e curto prazos. Normalmente participam dessas reuniões representantes das várias equipes envolvidas, mesmo que subempreitadas, e também representantes de diferentes áreas funcionais da organização.
Nessas reuniões são discutidos os problemas referentes a datas, recursos e formas de execução, dentre outros, sempre havendo um diálogo entre as partes envolvidas. A combinação da gestão participativa, da transparência de processos e do curto ciclo de controle cria condições para a ocorrência de melhoria contínua e, consequentemente, aprendizagem ao longo da obra.
Fonte: Civilização Engenharia